tenho vontade de partir, não sei, para qualquer lugar. o lugar onde só exista mar, onde invariavelmente estarás a remendar o teu corpo. pensar-te, neste momento, seria enlouquecer, seria manter o eterno estado de embraguiez, onde, todas manhãs, ia descobrindo o teu lento balbuciar, entre a almofada e os lençóis, e as pálpebras abriam esse olhar nacarado que marcava o início de todos os dias.
o eterno odor desse quarto onde crescemos, faz-me viajar às noites de primavera em que adormecíamos no silêncio da paisagem. por vezes o cão ladrava e ouvíamos as ovelhas ao longe. mas estávamos a caminhar para o precipício - cada um para o seu. passaram tantos meses depois do nosso adeus, mas teimamos em não partir. pergunto hoje, partir para onde e teimar para quê?
talvez te encontre agora, no ciciar de um cigarro,
no copo de vinho quase vazio ou na página de um livro que não vou abrir. recolho-me mais um pouco nesta luz suave que vai invadindo o meu rosto. amo-te.